REPORTAGEM
por Deco Ribeiro*
Então, você encontrou aquele boy magia, rolou uma química, vocês ficam de rolo... E logo bate aquela neurose: O que será que ele faz longe de mim? Será que tá saindo pra balada sem eu saber? Será que tá galinhando na internet? Não se preocupe: com os rapazes a seguir, você não terá esse problema: porque estão todos presos!
Andrew Webb (Imagem: Hot Prison Pals)
Dentro das celas, fora do armário
Não finja surpresa. Você já assistiu a Carandiru, sabe que há gays no sistema carcerário. “Somos muitos e estamos em todos os lugares”, certo? Gays também roubam, sonegam, agridem... Matam. E vão presos.
Antes, porém, que você dê asas aos seus fetiches de “sexo na prisão”, saiba que a vida atrás das grades, se já é dura para qualquer pessoa, é mais ainda para o prisioneiro gay. Muitos, sem um companheiro, sem apoio da família e, portanto, sem visitas, estão duplamente condenados: à prisão e à solidão.
O que pode, sim, surpreender você é que, pelo menos nos Estados Unidos, existem sites cujo objetivo é colocar em contato os prisioneiros gays com os daqui de fora – e funcionam!
Os sites
É fácil encontrar “seu” prisioneiro. Os sites são variados, e existem desde os mistos até os exclusivamente gays. Alguns facilitam a busca, dividindo por orientação sexual. Em outros, é preciso dar uma caçada perfil por perfil, mas cada foto... Por si só, fazem você se coçar de vontade de escrever. Fomos conversar com alguns responsáveis pelos sites para entender de onde veio essa ideia.
Brian Rocheleau (Imagem: Hot Prison Pals)
Alice Stephenson, do CellPalls!, lançou seu site em 1999, a pedido de sua filha, que era carcereira. “Ela me contou que, quando chegavam as cartas, era o momento mais triste do dia, pois muitos nunca recebiam nada e todos esperavam por alguma comunicação. Toda vez. Minha filha começou a convencer seus amigos e parentes a escrever para aqueles que nunca recebiam cartas. Daí para o site, foi um pulo”, conta Alice.
Sam Wagner, do Hot Prison Pals, começou o seu em 2003, após um amigo ser preso. “Soube da prisão dele por uma carta que ele escreveu pedindo ‘por favor, escreva de volta!’. Respondi, e começamos a nos corresponder. Logo, comecei a receber cartas de outros prisioneiros que não tinham ninguém no mundo e apenas queriam uma chance de desabafar – e logo estava me correspondendo com cerca de 20 caras que só queriam essa conexão com o mundo exterior”, conta Sam. “Eles não procuravam amor ou romance, mas simplesmente um ‘Oi, como está?’. Foi daí que tive a ideia de criar o site”.
No entanto, Sam queria um diferencial. “Já havia alguns sites de correspondência com prisioneiros, e eu queria que o meu fosse diferente. Resolvi postar apenas prisioneiros que fossem realmente gatos. Eles precisam de cartas como qualquer outro, mas assim meu site se destacaria na internet e mais gente escreveria pra eles. Deu certo!”.
Sam recebe centenas de pedidos de inclusão por mês, mas garante que só publica os mais gatos, cerca de dez a quinze. Os demais, ele manda para outros sites, como o de Alice. Todos ficam felizes. “Os presos chegam até nós assim, por indicação ou por boca a boca”, diz Alice. “Existe uma pequena taxa de manutenção, que todos cobram, mas, às vezes, abro mão de receber. Não é pelo dinheiro: o importante é que cada um receba sua cartinha”.
Sobre os prisioneiros gays, tanto Alice quanto Sam afirmam que seus sites não discriminam e que os homossexuais têm sempre um bom retorno: “Quarenta por cento dos usuários do site são homens, que escrevem para outros homens”, diz Sam. “Como os presidiários gays são uma pequena minoria, acredito que recebam, sim, mais cartas”.
As cartas viram romance? “Muitos acabam se encontrando, fora da prisão ou mesmo visitando os correspondentes na cadeia”, conta Alice. “Já recebi vários pedidos de retirada de anúncios de presos que iniciam um relacionamento sério”. Sam confirma que já viu até casamento, mas heterossexual. Agora, com o casamento gay sendo aprovado em vários estados dos EUA, quem sabe, né?
Os gatos
Ok, vamos ao que mais interessa: os bofes. Claro que tínhamos de testar o sistema e ver se realmente um daqueles perigosos gostosões iria responder. Escolhemos testar o ConvictPenPals.com, pela praticidade: você pode escrever diretamente no site que eles imprimem e mandam pelo correio para o preso à sua escolha. A resposta vem por carta normal. Mandamos pros mais gatos (óbvio!).
Alex Eyhorn (Imagem: Convict Pen Pals)
Demorou, mas recebemos uma resposta do belo Alex Eyhorn. “Olá!! =) Recebi sua carta hoje e fiquei muito contente! O Brasil é um lugar tão incrível, e sei que os caras daí são tão gatinhos..! Obrigado por escrever!”. Não sei você, mas ele me ganhou já na carinha feliz...
“Não, eu não recebo muitas cartas”, continuou ele (sim, eu perguntei – e estranhei a resposta. Se ele, gato daquele jeito, não recebia cartas... Coitados dos outros!). “Vou adorar contar tudo sobre a vida gay aqui de dentro se você me contar sobre sua vida gay daí de fora. Combinado?”. Combinadíssimo. Ele pareceu tão alegre e curioso sobre mim quanto eu sobre ele. Já estamos trocando fotos. Podem ir tirando o olho.
Billy Shelton (Imagem: Gay Prisoners.net)
Dicas
Tanto Sam quanto Alice pediram que qualquer um que se aventure a escrever seja cuidadoso com seus dados pessoais. Usem uma caixa postal em vez de endereço, se possível. Evitem fotos que demonstrem sinais de riqueza. Não mandem dinheiro. Lembrem-se que todos ali cumprem pena por algum crime e, muitas vezes, não sabemos qual. Não, ainda não perguntei qual o pecado do jovem Alex. Talvez na próxima carta.
Agora, se você não fala inglês, más notícias: não há nada do gênero em terras tupiniquins, mas fica a ideia, por que não? Se joga!
Jamie Sheffield (Imagem: Convict Pen Pals)
*Deco Ribeiro, 41, é jornalista, gay e diretor da Escola Jovem LGBT. Se não fosse casado, já estaria inscrito na visita íntima de certa prisão no Texas...