ENTREVISTA

Dois buracos são melhores do que um

Com esse slogan (em inglês, "two holes are better than one"), o ator Buck Angel tem rompido barreiras e revolucionando o cinema pornô. Descubra o porquê!

por João Marinho

Bissexual, ele adora sexo. Forte, másculo e dominador, não difere muito de um homem que se preocupa com o físico: malha cinco dias por semana, mantém uma dieta saudável e toma testosterona, o hormônio masculino, regularmente.

Espera! Toma hormônio? Sim, Buck Angel, esse machão que você vê aqui, não produz testosterona porque é um homem especial: não tem testículos, nem pênis.

Californiano e morador de Nova Orleans (EUA), Angel é um transexual FTM (do inglês female to male, mulher para homem). Nasceu como mulher e começou a transição para o sexo masculino com cerca de 20 anos de idade, mas decidiu permanecer com o sistema geniturinário feminino: tem útero, ovários e uma vagina que põe em ação em cenas com homens, mulheres e outras pessoas trans. De quebra, tornou-se a nova sensação do pornô.

Saiba mais sobre esse instigante personagem nesta entrevista à Sex Boys, a primeira feita para uma publicação brasileira.

Sex Boys: Primeiramente, eu gostaria de saber um pouco mais sobre você, Buck. Como era sua vida antes de começar a transição para o sexo masculino?

Buck Angel: Bem, eu era uma pessoa muito infeliz. Ironicamente, trabalhei como modelo, e as pessoas me consideravam uma mulher bonita [N.R.: veja as fotos “antes e depois” dele], mas sempre me senti um homem – e vivia num corpo feminino. Para mim, era terrível. Fui alcoólatra e dependente de drogas, entrava em brigas o tempo todo. Eu realmente queria morrer. Então, um dia, vi um filme em que uma mulher tinha feito a troca de sexo e soube que eu não precisava sofrer mais. Encontrei um médico que me ajudou com minha mudança. Basicamente, ele salvou minha vida.

 

SB: E de que forma se deu essa mudança?

BA: Comecei tomando injeções de testosterona com meu médico, que me ensinou a administrá-las em mim mesmo. Também frequentei um terapeuta, que foi muito compreensivo.

 

SB: Você fez alguma cirurgia, imagino.

BA: Só fiz uma: tive minhas mamas retiradas dois anos depois de ter começado o tratamento hormonal, embora muitos FTMs façam mais. Eles podem optar por uma histerectomia [N.R.: retirada do útero] e alguns também fazem cirurgia genital. Eu decidi não fazer nenhuma delas. Há desejos e motivações individuais que variam de um homem para outro. Meu motivo é que não sinto que uma cirurgia peniana seja funcional ou estética o suficiente para mim.

 

SB: Não é comum ver transexuais com uma relação de aceitação com sua genitália original...

BA: Sim, é muito incomum que homens FTM se sintam confortáveis em não ter um pau. Sou diferente porque amo a mim mesmo e quem eu sou e não sinto que precise de um pau para ser um homem. Minha chana é legal, eu adoro sexo e amo os homens. Muitos me acham gostoso e sexy e adoram foder minha chana – e eu tenho muitos paus, mas eles ficam na gaveta quando não estou usando [risos]. Então, por que preciso de um pênis?

 

SB: Li que você chama seu clitóris de “pau”, e ele é realmente grande. Quanto mede?

BA: Bem, eu só o chamo assim algumas vezes... Mas, sim, é como se ele fosse um “minipau”, e é muito maior que o de uma mulher. Da base até o topo, mede cerca de 7 cm quando mole e, ereto, pode crescer ainda mais.

 

SB: Também li que sua família já tratava você como um garoto.

BA: Eu sempre fui muito “menininho”, e minha família frequentemente se referia a mim como um menino, o que era ótimo! Mas, quando havia eventos especiais, eles queriam me pôr num vestido. Era chato e até confuso. Então, quando disse a eles que faria a troca de sexo, não ficaram surpresos.

 

SB: E os amigos?

BA:  Alguns se incomodaram, especialmente as lésbicas. Elas sentiam como se eu estivesse me “bandeando” para o lado inimigo! O interessante é que muitas das mulheres que mais faziam objeções também empreenderam mudanças sexuais depois.

 

SB: Você tem filhos ou planeja ter?

BA: Não. Prefiro bichos de estimação. Tenho cachorros e um gato. Crianças não cabem no meu estilo de vida.

 

SB: Mas está comprometido? Com pessoas de qual sexo você costuma namorar?

BA: Tenho me tornado cada vez mais bi. Eu realmente amo fazer sexo com homens e mulheres. Há muito mais sobre uma pessoa do que a qual gênero ela pertence. Tenho também uma escrava full-time e, claro, faço sexo com muitas pessoas, de todos os tipos, por meio do meu trabalho, que também é divertido.

 

SB: E por que você decidiu ser um ator pornô?

BA: Por anos, trabalhei do outro lado da câmera. Tinha um site para uma bonita transexual MTF (male to female) asiática e produzia vídeos de fetiche. Então, percebi que não havia ninguém como eu no pornô, e a Robert Hill Releasing [N.R.: uma produtora pornô] me contratou. Foram os únicos que quiseram me dar essa chance.

 

SB: Tem idéia de quem seja o seu público?

BA: A maioria é gay, mas também tenho fãs do sexo feminino. Mulheres, héteros e lésbicas, parecem gostar do meu trabalho.

 

SB: Você acha que sua condição como um pornstar FTM ajuda a mudar nossa percepção sobre sexo e sexualidade?

BA: Com certeza, e de muitas maneiras. Em primeiro lugar, mostra os FTMs para pessoas que nem sabiam que existíamos. Também sei que ajuda os FTMs. A maior parte dos que não passaram pela cirurgia genital fica incomodada por não ter um pau. Então, é comum, para eles, só dar, sem receber sexualmente. Agora, tenho ouvido de muitos FTMs e de seus parceiros que suas vidas sexuais estão muito melhores porque eles vêem que, se um cara como eu pode usar sua chana e gostar disso, eles podem fazer o mesmo. Também estou rompendo barreiras sobre o gênero por promover o conceito de que não preciso de um pau para ser um homem. Não acredito que o que está entre suas pernas é a única coisa que determina o gênero.


Publicado em 17/02/2011.

* Crédito das imagens: reprodução/divulgação